A discussão sobre a partilha de bens após o fim do relacionamento pode ser muito desgastante, em especial para os casais que não realizaram qualquer tipo de planejamento patrimonial.
Nos casos em que a relação sequer foi formalizada, na hora da partilha podem existir inclusive surpresas, já que o casal não teve a chance de escolher o seu próprio regime de bens.
Nesses casos é aplicado o regime imposto pela lei, o da comunhão parcial, em que tudo que for adquirido durante o relacionamento será partilhado, sendo que o que foi adquirido antes da relação por cada um é bem particular.
Dessa forma, se um bem (móvel ou imóvel) foi adquirido por alguma das partes antes de começarem a relação, esse bem não será partilhado ao final.
Mas a história muda bastante quando falamos sobre um imóvel financiado comprado antes do relacionamento mas com parcelas pagas durante.
Nesses casos, especificamente, as parcelas pagas ao longo do relacionamento serão sim partilhadas. No entanto, isso não significa que não existe uma solução para o que é visto como um problema pelo casal nesses casos.
Por isso, neste artigo iremos explicar como funciona a partilha do bem financiado, como você pode evitar a partilha e quais são as consequências de não seguir as regras impostas pela lei.
Como funciona a partilha do bem financiado?
O bem (imóvel ou móvel) financiado pode ter sua partilha realizada de diversas formas. Tudo depende do regime de bens aplicado e da existência ou não de cláusulas específicas nesse sentido no planejamento patrimonial realizado pelo casal.
Talvez você já tenha parado e refletido: “e se nós não tivermos planejado nada?”.
Não se preocupe, pois este artigo é justamente para explicar e alertar como funciona a partilha de bens financiados aos casais que não formalizaram a sua união e como consequência não sabem ou sabem muito pouco sobre a partilha de bens.
Para que você entenda melhor, vamos começar com um exemplo.
Vamos imaginar que Joana e Mauro começaram um relacionamento um pouco mais velhos e estavam juntos há quase 7 anos, sem ter se casado no papel ou formalizado a união estável que mantinham. Com o fim do relacionamento, ainda em 2022, descobriram na internet que por conta dessa informalidade o regime de bens aplicado seria o da comunhão parcial de bens.
Sabendo disso, começaram em conjunto e de forma amigável a elencar os bens que adquiriram ao longo da relação.
Foi então que Joana se deu conta que o imóvel em que residiam havia sido adquirido por ela alguns meses antes do início da relação de forma financiada e que inclusive ainda existiam muitas parcelas a serem pagas. Na época, Joana deu uma ótima entrada e parcelou o restante do valor, que seguiu sendo pago unicamente por ela ao longo do relacionamento.
Por força da lei, todas as parcelas que Joana pagou ao longo do casamento devem ser partilhadas meio a meio pelo casal. E dessa imposição legal decorrem duas questões muito importantes.
A primeira delas é que independente de Joana ter adquirido sozinha o financiamento e então continuado a pagar as parcelas, o regime de bens do casal presume o esforço comum. Ou seja, presume que durante o relacionamento o que o casal adquire é feito em conjunto, por estarem partilhando uma vida a dois.
Logo, do início ao fim do relacionamento o que foi adquirido será, como regra, partilhado.
No caso do bem financiado, você pode estar se perguntando como há a partilha se o financiamento foi adquirido antes. Nesse sentido, é importante entender que o financiamento é feito para a aquisição de um bem e que essa aquisição acontece de forma parcelada, mensalmente, com o pagamento de cada parcela.
Ou seja, a aquisição se protrai no tempo e por isso o que é pago durante o relacionamento é partilhado.
Caso Joana já tivesse finalizado o pagamento do financiamento quando iniciou o relacionamento ou então tivesse pago à vista o bem também antes de iniciar a relação, o bem não seria de forma alguma partilhado.
A segunda questão é que Joana não é a proprietária do bem, pois o financiamento ainda está sendo pago. Dessa forma, a partilha é somente do que foi pago, isto é, adquirido, durante a união.
Portanto, na prática, Joana deve indenizar Mauro no valor de 50% das parcelas pagas ao longo do relacionamento, sendo que ele não terá qualquer direito à propriedade em si do imóvel.
É importante ressaltar esses pontos pois muitos casais acreditam que o que será partilhado é a propriedade do bem. No entanto, no caso de o financiamento ter sido adquirido exclusivamente antes da relação por uma das partes, não se fala em divisão de propriedade, mas somente das parcelas, o que é feito, como dito, com o pagamento de uma indenização.
É possível excluir o bem financiado da partilha?
Uma vez não formalizada a união e adquirido um bem durante esse tempo, automaticamente esse bem será partilhado. Portanto, não há como, depois de ocorridos tais fatos, impedir uma partilha.
No entanto, é juridicamente possível evitá-la e isso pode ser realizado através de duas ferramentas que muitos casais acreditam serem insignificantes: a formalização da união estável ou a elaboração de um pacto antenupcial.
O ato de escolher como cada bem será partilhado em caso de divórcio ou de dissolução da união estável é um poder que deve ser utilizado antes mesmo de se cogitar essas possibilidades.
Inclusive, se você estiver iniciando um procedimento de divórcio e não sabe o que fazer, vale a leitura do nosso último artigo publicado: “Divórcio, qual o primeiro passo?”
De fato, os casais não colocam a vida financeira (particular e como um casal) como algo que precisa ser abertamente discutido e amplamente planejado e, com isso, acabam sofrendo as consequências de uma partilha desgastante e onerosa em razão do tempo do processo, das custas processuais e com advogados, pagamento de impostos, dentre outras questões.
Com o planejamento patrimonial, o casal pode ter a assessoria de um(a) advogado(a) especialista na área que indicará a melhor ferramenta para o caso.
No que se refere à exclusão de um bem financiado da partilha, a primeira ferramenta citada que pode ser utilizada é a formalização da união estável. Com esse planejamento, o casal pode optar por um regime de bens diverso do da comunhão parcial, como por exemplo o da separação de bens.
Nesse regime, nada será partilhado pois todos os bens são particulares.
No entanto, se o casal não quiser optar por esse regime de bens, por muitos considerado injusto, poderão permanecer com o da comunhão parcial.
Nesse caso, para afastar a possibilidade da partilha do bem específico financiado por somente uma das partes, poderão estabelecer uma cláusula que torne o bem particular independente do pagamento das parcelas ao longo da relação. Dessa forma, esse bem ficará resguardado.
Já se o casal optar por casar civilmente, o pacto antenupcial proporciona as mesmas possibilidades de escolha de regime de bens e aplicação de cláusulas específicas.
Por isso, Joana e Mauro poderiam ter escolhido qualquer uma dessas opções, desde que seus desejos e intenções fossem preservados.
Isso demonstra o quanto é importante estar assessorado por um(a) advogado(a) especialista, que saiba analisar corretamente o caso e prever situações que muitas vezes as partes não conseguem imaginar, apresentando-lhes a solução mais viável e menos custosa.
Se concordarmos amigavelmente em não partilhar as parcelas do bem financiado, o que acontece?
De fato, há a possibilidade de o casal consensualmente decidir sobre a forma da partilha dos seus próprios bens, o que acaba tornando o desgaste menor.
No entanto, é importante saber que se estivermos falando de uma partilha desigual, os gastos financeiros não serão necessariamente menores.
Em casos como o apresentado neste artigo, em que por lei as parcelas do financiamento pagas durante o relacionamento precisam ser partilhadas, se o casal opta por não partilhá-las, deixando-as para a parte que é a proprietária do financiamento, necessariamente haverá uma desigualdade na hora da partilha.
Dessa forma, um valor que precisa ser partilhado meio a meio, por força do regime de bens, ficará com somente uma das partes.
Pense no exemplo que demos acima. Se Joana e Mauro decidirem em conjunto que Mauro não vai receber metade dos valores das parcelas, isso significa que Joana ficará com esta metade. Ou seja, ela ficará com mais do que lhe é de direito.
A lei permite esse tipo de divisão desigual. No entanto, a parte que ficar com um quinhão maior, deve pagar imposto sobre o que excedeu.
Por isso é extremamente importante, antes de optar por esse tipo de partilha, saber exatamente no que ela implica.
A divisão desigual na maioria das vezes é consequência da falta de um planejamento patrimonial.
Afinal, se o casal tivesse formalizado a união ou então realizado um pacto antenupcial, não seria necessário no momento da separação haver desigualdades, já que tudo já teria sido previsto adequadamente conforme a realidade das partes.
Por isso o planejamento prévio de como o patrimônio deverá ser partilhado evita maiores gastos, principalmente com impostos.
Conclusão
A partilha de bens financiados é realizada com base no regime de bens do casal e na existência ou não de cláusulas específicas nesse sentido.
No entanto, como dito, a regra é a informalidade do relacionamento atualmente, o que é consequência da falta de um planejamento patrimonial do casal, que pode sofrer perdas patrimoniais irreparáveis no futuro em caso de fim do relacionamento.
Dessa forma, para que tais questões possam ser previamente conhecidas e impedidas de acontecer, é necessário realizar o seguinte passo a passo:
- consultar um(a) advogado(a) especialista em direito de família e também em sucessões (no planejamento também é importante prever questões sobre inventário);
- entender o que você, sozinha e como parte de um casal, deseja; e
- escolher a(s) ferramenta(s) adequadas para realizar o planejamento patrimonial.
Dessa forma, as surpresas (ruins), com a perda de um bem ou com gastos não planejados podem ser evitados.
Para entrar em contato com um especialista do escritório, clique no botão de whatsapp ao lado dessa página.